terça-feira, 21 de junho de 2016
quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008
I still believe in god, but god no longer believes in me
Olá, alminhas vivas que possam passar por aqui. É faz quase um ano que não posto nada no blog. De fato, foi a pura e velha e desgraçada preguiça. 2007 foi um ano em que produzi pouco, de qualquer jeito.
Enfim, o ano chega com tudo. Estou escrevendo como nunca!
Por isso, vou deixar aqui um lembrete. Diferente dos outros textos que antes aqui publiquei, este foi feito há pouco tempo (na verdade, hoje): pra quem não sabe,
estou começando um carreira solo como músico e escritor, sem deixar as bandas e projetos dos quais participo, mas ao mesmo tempo, procurando um som que tenha a minha cara. E apostem que vai ser um som bem diversificado!
Enfim, esta é a letra de "I still believe in god, but god no longer believes in me"
O título é tirado da frase que Wayne Hussey do The Mission fala no começo da música 'Wasteland' do álbum 'Gods own medicine'. Um dos melhores cds que já ouvi.
Pode-se dizer que ultimamente estou criando músicas próprias a partir de frases que ouço em músicas de outros cantores. Não esperem que essa seja a única ^^
"i have worked my life, to be as saint
for no sinner at hand, i could ever be mistaken
oh the pope and the father, i always obeyed
all catholic principles, delved deep in my brain
though i kept searching for the answer, the truth of religion
i plunged deep into the mysteries of life
but now i am only a man (made of flesh made of flesh)
the pleasures of the nightlife, they made me comprehend
for what ever lies, in the shadows of dogma
they could also be found... in the legs of a whore
a whore....
i still believe in god, but god no longer believes me yeah yeah
why can't my sacrossaint flesh be corrupted so easily? humm yeah
so
isn't the vatican territory enough for all of the bullshit
that they all need to make our bodies their private courtyard
so is this is feeling forbidden...? the feelings of love
i bet half of them priesthood have not ever ignored (that feeling)
for lies that are repeated many times, become our truth
oh never, ever ever oh no more, i'll listen to fools
i'll carry the blues
carry the blues, yeah
i still believe in god, but god no longer believes me yeah yeah
why can't my sacrossaint flesh be corrupted so easily? humm yeah
i do still believe in god, but our lord no longer believes me
why can't my sacrossaint goddamn flesh be oh corrupted so easily?"
~~~~~~~~~~~~~~~~~~
Penso nela inicialmente como um blueszinho. Quem sabe ela não muda?
*Pra quem quiser copiar a minha letra: estou de olho, e não é só o meu não.
sábado, 24 de fevereiro de 2007
Ocaso - Prólogo do fim
Ocaso
“Ver”. Olho pela janela. Bate uma vontade de correr e fugir. Observo o movimento de massas e capacetes verdes. Percebo o fim à minha frente. Será todo o esforço, o amor, a dedicação de tantas pessoas e companheiros que morreram ou que continuam a sofrer nos porões e claustros da sociedade que buscávamos pôr fim, perdidos?
Como poderia eu correr? Pensamento idiota, aja como o homem forte que foi até agora. Dizem que no fim sempre chamamos por deus. De fato, é o que estou a fazer. No momento da Morte, o homem abdica de toda sua tão apreciada lógica. No final, o homem é todo coração. Arrependemo-nos de tudo que deveríamos ou não ter feito, pensamos naqueles que perdemos e naqueles que devemos evitar perder. Mas, acima de tudo, o homem é seu Ego.
As tropas se movem mais para perto. Suicido-me? O que passa pela minha cabeça é que qualquer saída para a situação seria um ganho. Mesmo que esta não exista. A Morte: a tão temida, não por ser calejada, difícil, dolorosa e excruciante. Mas por ser o Fim. “Será mesmo? Espero que não”.- é a pergunta que nos fez buscar a religião. Para nos dar um novo paraíso, uma saída para o maior mistério da humanidade. E, ao mesmo tempo, dar sentido à existência. De todo jeito, seria Morte um Fim para um Início? Ou o período chamado Vida é algo não-contínuo, e que a sensação de linearidade que temos seja apenas um mecanismo bioquímico da própria enganação? Não tenho mais Tempo.
Bombas explodem no pé do prédio. Sinto o tremor e vejo as fotos de meus companheiros serem manchadas por uma torrente de areia e entulhos. Percebo a catarse inerente ao momento se esvair como água num riacho de um dia ensolarado. Preciso agir: o rifle em minhas mãos, corro para o pequeno abrigo construído anos antes, para uma situação como esta. Para isso teria que descer as escadarias cambaleantes no meio das bombas, do ruído dos engenhos dos aviões, da sinfonia cadavérica dos corpos sendo mutilados e das gargantas coléricas, esperneantes, caladas pelo aço. O Bacamarte do Fim estremece e os ouvidos murcham: percebo que mais uma de nossas defesas principais é agora pó. Do pó ao pó. Clichê, mas nunca tão bem dito.
Ou morro ou corro. Prefiro o segundo. Desço as escadarias célere, para encontrar um jovem soldado inimigo absorto na destruição, não me percebendo. Tenho que o matar. Ainda assim vejo a tristeza em sua face de adolescente, uma vida desperdiçada em beligerância, um garoto que nunca conheceu a efêmera beleza da juventude, ignorante aos malefícios do Poder e alienado a uma ideologia catastroficamente errônea. Lábios que provavelmente nunca receberam os de um semelhante seu. Lindo, pois, o considerava. Se possível o tomaria como filho meu. Talvez em outra encarnação. Puxo o gatilho.
Tomo o elevador manual do pequeno abrigo. Desço até o porão de armas e rações que junto com todos amigos e companheiros (muitos sem um funeral descente, provavelmente neste momento tendo seus restos roídos ou pelo verme ou pela máquina de guerra), em dias mais felizes, quando nossa ideologia era forte e os corações queimavam na vontade de mudar o mundo. Assim como aqueles que tentaram antes de nós, décadas, séculos atrás. Penso não apenas nos ensinamentos do velho sábio, que nunca cheguei a conhecer, mas que acendeu a faísca da revolução em muitas mentes que, junto comigo, tentaram peitar o opressor de cara. Apesar da nossa iminente derrota, tenho certeza que algum dia o feito será lembrado por uma geração posterior que poderá viver tudo que o Soldado Adolescente terminou trocando por Guerra, Aço, Fogo, Dor.
Abro o alçapão, olho em volta. Em meu pequeno abrigo tenho mantimentos para aproximadamente uma semana. Resisto.
“Dez dias passaram-se. Olhando pela pequena escotilha do abrigo vejo um Ocaso rubro e inegavelmente frio. Não há árvores, não há prédios, não há vida, há escombros, putrefação, chuva e uma névoa fina que lembra cinza vulcânica. Isso reflete não só a paisagem do exterior como também a do meu âmago. Dez dias são suficientes, em minha concepção, para se pensar numa eternidade de assuntos que por via poderiam parar em minha cabeça. Existencialmente, minha hora foi prolongada um pouco em relação ao dia em que resolvi fugir do Fim, mas sinto que com o nível de água, ração e sanidade que me resta, não durará a chegar. De fato aqui escrevo a última página do Diário do Claustro.”
Quiçá o homem ou mulher que achar tais páginas será tocado pelas palavras de um velho quase louco. De qualquer maneira, agarro meu rifle e me lanço para a abertura da escotilha, não só para o Fim, mas para uma incógnita praia azul no meio de um coqueiral, para os braços de uma musa desconhecida de olhos claros, para o cosmos do Universo, como um viajante sideral. Minha ficção é minha sobrevivência. Assim como a de todos. Vida é a Ficção que nós romantizamos para não morrer de solidão. Sempre foi assim. Nadando contra a corrente ou navegando nela, nunca estamos em cima da margem. Corro e caio em entulhos, ouço barulho de tiros contra mim, um deles acaba por rasgar minha fronte. Estando ainda de pé e com sangue quente correndo sobre mim, vou em cima do Inimigo. A esperança não é a última que morre?
“Ver”. Olho pela janela. Bate uma vontade de correr e fugir. Observo o movimento de massas e capacetes verdes. Percebo o fim à minha frente. Será todo o esforço, o amor, a dedicação de tantas pessoas e companheiros que morreram ou que continuam a sofrer nos porões e claustros da sociedade que buscávamos pôr fim, perdidos?
Como poderia eu correr? Pensamento idiota, aja como o homem forte que foi até agora. Dizem que no fim sempre chamamos por deus. De fato, é o que estou a fazer. No momento da Morte, o homem abdica de toda sua tão apreciada lógica. No final, o homem é todo coração. Arrependemo-nos de tudo que deveríamos ou não ter feito, pensamos naqueles que perdemos e naqueles que devemos evitar perder. Mas, acima de tudo, o homem é seu Ego.
As tropas se movem mais para perto. Suicido-me? O que passa pela minha cabeça é que qualquer saída para a situação seria um ganho. Mesmo que esta não exista. A Morte: a tão temida, não por ser calejada, difícil, dolorosa e excruciante. Mas por ser o Fim. “Será mesmo? Espero que não”.- é a pergunta que nos fez buscar a religião. Para nos dar um novo paraíso, uma saída para o maior mistério da humanidade. E, ao mesmo tempo, dar sentido à existência. De todo jeito, seria Morte um Fim para um Início? Ou o período chamado Vida é algo não-contínuo, e que a sensação de linearidade que temos seja apenas um mecanismo bioquímico da própria enganação? Não tenho mais Tempo.
Bombas explodem no pé do prédio. Sinto o tremor e vejo as fotos de meus companheiros serem manchadas por uma torrente de areia e entulhos. Percebo a catarse inerente ao momento se esvair como água num riacho de um dia ensolarado. Preciso agir: o rifle em minhas mãos, corro para o pequeno abrigo construído anos antes, para uma situação como esta. Para isso teria que descer as escadarias cambaleantes no meio das bombas, do ruído dos engenhos dos aviões, da sinfonia cadavérica dos corpos sendo mutilados e das gargantas coléricas, esperneantes, caladas pelo aço. O Bacamarte do Fim estremece e os ouvidos murcham: percebo que mais uma de nossas defesas principais é agora pó. Do pó ao pó. Clichê, mas nunca tão bem dito.
Ou morro ou corro. Prefiro o segundo. Desço as escadarias célere, para encontrar um jovem soldado inimigo absorto na destruição, não me percebendo. Tenho que o matar. Ainda assim vejo a tristeza em sua face de adolescente, uma vida desperdiçada em beligerância, um garoto que nunca conheceu a efêmera beleza da juventude, ignorante aos malefícios do Poder e alienado a uma ideologia catastroficamente errônea. Lábios que provavelmente nunca receberam os de um semelhante seu. Lindo, pois, o considerava. Se possível o tomaria como filho meu. Talvez em outra encarnação. Puxo o gatilho.
Tomo o elevador manual do pequeno abrigo. Desço até o porão de armas e rações que junto com todos amigos e companheiros (muitos sem um funeral descente, provavelmente neste momento tendo seus restos roídos ou pelo verme ou pela máquina de guerra), em dias mais felizes, quando nossa ideologia era forte e os corações queimavam na vontade de mudar o mundo. Assim como aqueles que tentaram antes de nós, décadas, séculos atrás. Penso não apenas nos ensinamentos do velho sábio, que nunca cheguei a conhecer, mas que acendeu a faísca da revolução em muitas mentes que, junto comigo, tentaram peitar o opressor de cara. Apesar da nossa iminente derrota, tenho certeza que algum dia o feito será lembrado por uma geração posterior que poderá viver tudo que o Soldado Adolescente terminou trocando por Guerra, Aço, Fogo, Dor.
Abro o alçapão, olho em volta. Em meu pequeno abrigo tenho mantimentos para aproximadamente uma semana. Resisto.
“Dez dias passaram-se. Olhando pela pequena escotilha do abrigo vejo um Ocaso rubro e inegavelmente frio. Não há árvores, não há prédios, não há vida, há escombros, putrefação, chuva e uma névoa fina que lembra cinza vulcânica. Isso reflete não só a paisagem do exterior como também a do meu âmago. Dez dias são suficientes, em minha concepção, para se pensar numa eternidade de assuntos que por via poderiam parar em minha cabeça. Existencialmente, minha hora foi prolongada um pouco em relação ao dia em que resolvi fugir do Fim, mas sinto que com o nível de água, ração e sanidade que me resta, não durará a chegar. De fato aqui escrevo a última página do Diário do Claustro.”
Quiçá o homem ou mulher que achar tais páginas será tocado pelas palavras de um velho quase louco. De qualquer maneira, agarro meu rifle e me lanço para a abertura da escotilha, não só para o Fim, mas para uma incógnita praia azul no meio de um coqueiral, para os braços de uma musa desconhecida de olhos claros, para o cosmos do Universo, como um viajante sideral. Minha ficção é minha sobrevivência. Assim como a de todos. Vida é a Ficção que nós romantizamos para não morrer de solidão. Sempre foi assim. Nadando contra a corrente ou navegando nela, nunca estamos em cima da margem. Corro e caio em entulhos, ouço barulho de tiros contra mim, um deles acaba por rasgar minha fronte. Estando ainda de pé e com sangue quente correndo sobre mim, vou em cima do Inimigo. A esperança não é a última que morre?
*Shot*
- Cabo, um cão velho saltou da terra. Meti-lhe uma bala entre os cocos.
- Heh, da terra? Coelhos fracos preferem o abrigo. Vamos, amanhã iremos voltar para casa. Nossas esposas estão preocupadas. O Chefe do Governo disse que irá revogar as pensões dos mortos.
- Ainda bem que só levei um arranhão, na guerra. Pobre coitada da minha Maria se eu morresse.
- Pois é. Sabe duma coisa, Oficial? Cá entre nós, às vezes me pergunto se o que esses nossos inimigos falavam de igualdade e paz não seria melhor que a ruína da casa da minha família e os míseros dois contos que recebo por mês.
- Ah, deixa a política pra lá... É melhor obedecer às ordens lá de cima e voltar pra casa antes do fim do dia para não perder a novela!
Leonardo Trevas, Setembro/2006
segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007
Memórias de uma Noite Qualquer
Memórias de uma noite qualquer
Ando olhando pros lados. Pessoas se amontoam pelos cantos, parecendo procurar por algo. Eu mesmo devo estar procurando por algo, mas não sei bem o quê. Isso não importa, afinal, são duas da madrugada, e tudo que consigo ouvir é o barulho distante, mas presente de alguma banda ruim junto ao burburinho da massa.
Estou no meio de um grande festival de música em alguma cidade do interior do estado. Vejo uma quantidade enorme de gente pobre e rica. Em contrapartida, os primeiros não parecem estar se divertindo, mas sim tentando arrumar algum trocado vendendo bebidas e comidas de quinta categoria com alguma margem de lucro. Vendendo “felicidade instantânea”, é o que parece. Ao menos para quem compra.
Estes compradores são os que mais me chamam a atenção. Andam sempre em grupo, falam alto, parecem demonstrar alguma alegria em seus rostos. Não é possível saber a que ponto é verdadeira essa tal “alegria”. Talvez provocada pela bebida superfaturada vendida pelo senhor de barba suja e boné de posto. O comprador, por sua vez muito bem barbeado, vestindo camisa e boné de aparência cara, conclui a negociação demonstrando certo desprezo. De fato, algumas horas depois este mesmo indivíduo vai estar em alguma rodinha de amigos, rindo de alguma piada racista ou etnocêntrica.
Entro no espaço reservado para o evento. Vejo um mar de cabeças. O som de má qualidade está muito mais irritante que antes. Observo as almas ao redor. Mulheres se amontoam em filas e discutem para usar o banheiro, latas e garrafas encalhadas às pilhas no chão, muitos dos pagantes vomitando o excesso de etanol em seus corpos.
Chego perto de um grupo de jovens. Visivelmente bêbados, alguns se aproveitam da sexualidade à flor da pele, no ritmo da dança sensual. Outros conversam sobre telenovelas, roupas de marca, celulares e pasmem, a quantidade que ingerem de certa substância (aparentemente ilegal) que infla sua massa corpórea. Percebo também a grande disparidade entre o tamanho de seus corpos e de seus intelectos.
Sinto-me enojado no ambiente. Percebo a ignorância dissimulada, o conservador misturado com o pseudo-liberal, a alienação e a decadência, as contradições de uma sociedade materializadas no que deveria ser a suposta “celebração da vida”.
Excedo-me e procuro a salvação mais próxima: a barraquinha de coquetéis. Duas horas depois, a alta concentração de venenos me embaça a visão dos olhos e da mente. Estranhamente, desenvolvo solitário a melhor das filosofias ébrias. Cambaleio atrás de um oásis de razão em meio ao deserto de lixo aos meus pés. Procuro uma superfície mais ou menos limpa onde possa me encostar, e o faço. Congelo meus pensamentos e mergulho no melhor dos sonos que Hypnos poderia me dar.
E isso para apenas acordar e assistir ao fim do espetáculo do denegrimento enquanto o sol desponta num céu azul-bebê. Levanto-me e caminho, a olhar para os lados da mesma forma que quando cheguei a este espaço.
Reparo na multidão deixando o recinto, nas mulheres e homens recostados de forma semelhante a que eu estava, e do princípio de ressaca que sinto, provavelmente acompanhado por meus colegas ao redor. Cansado, um último lapso analítico me vêm à cabeça. Enquanto a mente entra em equilíbrio com o meio, observo a juventude burguesa.
No ponto de ônibus, o impulso de agir é iminente. Chego em casa, como e durmo, mas não antes de gravar em papel as memórias desta noite.
As palavras contidas nesta folha são fruto deste impulso. Não peço nada mais que alguns minutos de seu tempo para refletir um pouco sobre este mesmo pedaço de papel, que virá a se degradar. A idéia, portanto, se viva dentro das mentes dos homens, não tem prazo de validade.
Leonardo Trevas
Ando olhando pros lados. Pessoas se amontoam pelos cantos, parecendo procurar por algo. Eu mesmo devo estar procurando por algo, mas não sei bem o quê. Isso não importa, afinal, são duas da madrugada, e tudo que consigo ouvir é o barulho distante, mas presente de alguma banda ruim junto ao burburinho da massa.
Estou no meio de um grande festival de música em alguma cidade do interior do estado. Vejo uma quantidade enorme de gente pobre e rica. Em contrapartida, os primeiros não parecem estar se divertindo, mas sim tentando arrumar algum trocado vendendo bebidas e comidas de quinta categoria com alguma margem de lucro. Vendendo “felicidade instantânea”, é o que parece. Ao menos para quem compra.
Estes compradores são os que mais me chamam a atenção. Andam sempre em grupo, falam alto, parecem demonstrar alguma alegria em seus rostos. Não é possível saber a que ponto é verdadeira essa tal “alegria”. Talvez provocada pela bebida superfaturada vendida pelo senhor de barba suja e boné de posto. O comprador, por sua vez muito bem barbeado, vestindo camisa e boné de aparência cara, conclui a negociação demonstrando certo desprezo. De fato, algumas horas depois este mesmo indivíduo vai estar em alguma rodinha de amigos, rindo de alguma piada racista ou etnocêntrica.
Entro no espaço reservado para o evento. Vejo um mar de cabeças. O som de má qualidade está muito mais irritante que antes. Observo as almas ao redor. Mulheres se amontoam em filas e discutem para usar o banheiro, latas e garrafas encalhadas às pilhas no chão, muitos dos pagantes vomitando o excesso de etanol em seus corpos.
Chego perto de um grupo de jovens. Visivelmente bêbados, alguns se aproveitam da sexualidade à flor da pele, no ritmo da dança sensual. Outros conversam sobre telenovelas, roupas de marca, celulares e pasmem, a quantidade que ingerem de certa substância (aparentemente ilegal) que infla sua massa corpórea. Percebo também a grande disparidade entre o tamanho de seus corpos e de seus intelectos.
Sinto-me enojado no ambiente. Percebo a ignorância dissimulada, o conservador misturado com o pseudo-liberal, a alienação e a decadência, as contradições de uma sociedade materializadas no que deveria ser a suposta “celebração da vida”.
Excedo-me e procuro a salvação mais próxima: a barraquinha de coquetéis. Duas horas depois, a alta concentração de venenos me embaça a visão dos olhos e da mente. Estranhamente, desenvolvo solitário a melhor das filosofias ébrias. Cambaleio atrás de um oásis de razão em meio ao deserto de lixo aos meus pés. Procuro uma superfície mais ou menos limpa onde possa me encostar, e o faço. Congelo meus pensamentos e mergulho no melhor dos sonos que Hypnos poderia me dar.
E isso para apenas acordar e assistir ao fim do espetáculo do denegrimento enquanto o sol desponta num céu azul-bebê. Levanto-me e caminho, a olhar para os lados da mesma forma que quando cheguei a este espaço.
Reparo na multidão deixando o recinto, nas mulheres e homens recostados de forma semelhante a que eu estava, e do princípio de ressaca que sinto, provavelmente acompanhado por meus colegas ao redor. Cansado, um último lapso analítico me vêm à cabeça. Enquanto a mente entra em equilíbrio com o meio, observo a juventude burguesa.
No ponto de ônibus, o impulso de agir é iminente. Chego em casa, como e durmo, mas não antes de gravar em papel as memórias desta noite.
As palavras contidas nesta folha são fruto deste impulso. Não peço nada mais que alguns minutos de seu tempo para refletir um pouco sobre este mesmo pedaço de papel, que virá a se degradar. A idéia, portanto, se viva dentro das mentes dos homens, não tem prazo de validade.
Leonardo Trevas
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